Print do Whats do Leilão de Plantão:
“Você não tem direito a nada, você não tem direito a férias, você não tem direito a ficar doente. Se você ficar doente você vai perder seu plantão e não receber nada”.
“Você não tem os dias fixos normalmente. A pessoa assina o contrato lá, mas tem o grupo de Whatsapp onde eles jogam os plantões lá e o que gritar primeiro pega o plantão”.
Parecer jurídico de Ernesto Emir Kugler Batista Junior, médico com especialidade em medicina do trabalho, Luciano Augusto de Toledo Coelho, Juiz Titular do Trabalho, e Marco Antônio César Villatore, Professor do UNINTER e do Programa de Graduação e de Pós-Graduação em Direito da UFSC:
Crônicas do Titanic: Médicos do Hospital de Campanha relatam que tem contrato de trabalho que "é uma espécie de caixa dois", isto é, não é contrato CLT, não é pessoa jurídica. Como pode conferir aqui: "Pela denúncia, para que os médicos fossem contratados, eles tinham que adquirir cotas de participação das empresas do grupo OGS e assinar uma autorização pra que os lucros fossem divididos". Dessa forma os trabalhadores não tem direito a descanso remunerado, férias, FGTS, previdência, atestado por problema médico. Essa situação é prevista na legislação trabalhista brasileira? Tem a ver com alguma inovação produzida pelo covid-19?
R: Com referência à análise do artigo por Filipe Gonçalves, Cléber Cândido e Roberta Giacomoni, SP1 e G1 SP — São Paulo e a pergunta realizada, há de se considerar que o tema traz múltiplos feixes de relação fática, e que proporcionam situações jurídicas com variados objetos de limites e conexões, que merecem prima facie uma análise em abstrato com base nos referências de informação.
A notícia trata da instituição de um hospital de campanha para a pandemia do Covid-19, e pelo que se extrai do artigo em questão, é fruto de decisão da administração pública municipal – SUS, e, para seu funcionamento necessita de mão de obra médica especializada, com relatos de efeitos em situações de prejuízo para os médicos contratados.
Inicialmente há de ser afirmar que há previsão constitucional para Sistema Único de Saúde contratar o setor privado para complementar os serviços que não possui em sua estrutura e funcionalidade. Este fato se constitui na saúde complementar.
Neste caso o contratante é a administração pública, e está sujeita a todos os requisitos legais e normativos para as contratações com o setor privado.
No caso apresentado o município contrata na forma da saúde complementar com empresa “A” de administração hospitalar do setor privado, e esta contrata a empresa “B” como terceirizada para a contratação de médicos para o trabalho especializado.
Ainda, como referido, a terceirizada “B” propõe que o contrato não siga a prática dos requisitos normativos para os contratos de emprego, mas propõe contrato de uma espécie de sociedade com aquisição cotas, e que a percepção do ganho do trabalho seria por distribuição de lucros.
Além destes feixes relacionais descritos há também a notícia das faltas de condições de trabalho, pois os espaços para o devido descanso dos profissionais de saúde se encontram em situações degradantes e humilhantes, fato que por si só gera danos à saúde física e mental dos profissionais, sem falar que já estão expostos ao trabalho de alto risco face ao agente infeccioso da pandemia.
Sob a questão da terceirização entre empresa “A” e “B” deste caso, há de se explicar que o STF já decidiu que é lícita a terceirização tanto para atividade–fim, como para atividade–meio e não caracteriza relação de emprego na terceirização, a questão é assente no princípio da livre iniciativa do empregador.
À contratante do serviço terceirizado compete verificar a idoneidade e a capacidade econômica da terceirizada e responder subsidiariamente pelo descumprimento das normas trabalhistas, bem como obrigações previdenciárias, na forma do art. 31 da Lei 8.212/1991.
Fundamento de acordão do STF com publicação em 09/2019 dão conta que: “a terceirização não enseja, por si só, precarização do trabalho, violação da dignidade do trabalhador ou desrespeito a direitos previdenciários. É o exercício abusivo da sua contratação que pode produzir tais violações”.
O Município como contratante originário tem por obrigação exigir o exemplar cumprimento do contrato de saúde complementar para com a contratada, regido pelas normas do poder público, instituindo sindicâncias e inquéritos em relação a indícios ou evidências de irregularidades contratuais.
Embora a terceirização seja lícita, e a sequência dos contratos devam observação ao princípio da boa fé contratual, na apresentação oferecida sobre a questão há evidências de abusividade, pois a contratada do serviço médico especializado detém a relação de empregador/empregado médico, porém na versão apresentada é dado forma diversa da realidade, assim sendo os médicos contratados eram convidados a assinar contrato diverso de concurso público ou, no mínimo, relação de emprego, e sob este aspecto os indícios de fraude e simulação para burlar a legislação trabalhista, previdenciária são verossímeis de abusividade.
É muito comum que se contratem médicos por concurso público e outros por meio de Fundações variadas, mas a responsabilidade do Município sempre existirá.
Por outro lado, as condições precárias de trabalho e a possível infração de natureza sanitária podem sofrer intervenção do poder público independentemente do contrato de trabalho.
É caso de encaminharem denúncia ao MPT, no caso do PR, será o http://www.prt9.mpt.mp.br/servicos/denuncias. Em SC será o http://www.prt12.mpt.mp.br/servicos/denuncias. No RJ, o http://www.prt1.mpt.mp.br/servicos/denuncias, etc.
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