CrĂŽnicas do Titanic
CrĂŽnicas do Titanic
đŸŽ™ïž O mĂ©dico iFood do Hospital de Campanha Anhembi (SP): nĂŁo Ă© CNPJ, nem CLT, Ă© outra coisa
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đŸŽ™ïž O mĂ©dico iFood do Hospital de Campanha Anhembi (SP): nĂŁo Ă© CNPJ, nem CLT, Ă© outra coisa

Print do Whats do LeilĂŁo de PlantĂŁo:

“VocĂȘ nĂŁo tem direito a nada, vocĂȘ nĂŁo tem direito a fĂ©rias, vocĂȘ nĂŁo tem direito a ficar doente. Se vocĂȘ ficar doente vocĂȘ vai perder seu plantĂŁo e nĂŁo receber nada”.

“VocĂȘ nĂŁo tem os dias fixos normalmente. A pessoa assina o contrato lĂĄ, mas tem o grupo de Whatsapp onde eles jogam os plantĂ”es lĂĄ e o que gritar primeiro pega o plantĂŁo”.

Parecer jurídico de Ernesto Emir Kugler Batista Junior, médico com especialidade em medicina do trabalho, Luciano Augusto de Toledo Coelho, Juiz Titular do Trabalho,  e Marco AntÎnio César Villatore, Professor do UNINTER e do Programa de Graduação e de Pós-Graduação em Direito da UFSC:

CrĂŽnicas do Titanic: MĂ©dicos do Hospital de Campanha relatam que tem contrato de trabalho que "Ă© uma espĂ©cie de caixa dois", isto Ă©, nĂŁo Ă© contrato CLT, nĂŁo Ă© pessoa jurĂ­dica. Como pode conferir aqui: "Pela denĂșncia, para que os mĂ©dicos fossem contratados, eles tinham que adquirir cotas de participação das empresas do grupo OGS e assinar uma autorização pra que os lucros fossem divididos". Dessa forma os trabalhadores nĂŁo tem direito a descanso remunerado, fĂ©rias, FGTS, previdĂȘncia, atestado por problema mĂ©dico. Essa situação Ă© prevista na legislação trabalhista brasileira? Tem a ver com alguma inovação produzida pelo covid-19?

R: Com referĂȘncia Ă  anĂĄlise do artigo por Filipe Gonçalves, ClĂ©ber CĂąndido e Roberta Giacomoni, SP1 e G1 SP — SĂŁo Paulo e a pergunta realizada, hĂĄ de se considerar que o tema traz mĂșltiplos feixes de relação fĂĄtica, e que proporcionam situaçÔes jurĂ­dicas com variados objetos de limites e conexĂ”es, que merecem prima facie uma anĂĄlise em abstrato com base nos referĂȘncias de informação. 

A notĂ­cia trata da instituição de um hospital de campanha para a pandemia do Covid-19, e pelo que se extrai do artigo em questĂŁo, Ă© fruto de decisĂŁo da administração pĂșblica municipal – SUS, e, para seu funcionamento necessita de mĂŁo de obra mĂ©dica especializada, com relatos de efeitos em situaçÔes de prejuĂ­zo para os mĂ©dicos contratados.

Inicialmente hĂĄ de ser afirmar que hĂĄ previsĂŁo constitucional para Sistema Único de SaĂșde contratar o setor privado para complementar os serviços que nĂŁo possui em sua estrutura e funcionalidade. Este fato se constitui na saĂșde complementar.

Neste caso o contratante Ă© a administração pĂșblica, e estĂĄ sujeita a todos os requisitos legais e normativos para as contrataçÔes com o setor privado.

No caso apresentado o municĂ­pio contrata na forma da saĂșde complementar com empresa “A” de administração hospitalar do setor privado, e esta contrata a empresa “B” como terceirizada para a contratação de mĂ©dicos para o trabalho especializado.

Ainda, como referido, a terceirizada “B” propĂ”e que o contrato nĂŁo siga a prĂĄtica dos requisitos normativos para os contratos de emprego, mas propĂ”e contrato de uma espĂ©cie de sociedade com aquisição cotas, e que a percepção do ganho do trabalho seria por distribuição de lucros.

AlĂ©m destes feixes relacionais descritos hĂĄ tambĂ©m a notĂ­cia das faltas de condiçÔes de trabalho, pois os espaços para o devido descanso dos profissionais de saĂșde se encontram em situaçÔes degradantes e humilhantes, fato que por si sĂł gera danos Ă  saĂșde fĂ­sica e mental dos profissionais, sem falar que jĂĄ estĂŁo expostos ao trabalho de alto risco face ao agente infeccioso da pandemia.

Sob a questĂŁo da terceirização entre empresa “A” e “B” deste caso, hĂĄ de se explicar que o STF jĂĄ decidiu que Ă© lĂ­cita a terceirização tanto para atividade–fim, como para atividade–meio e nĂŁo caracteriza relação de emprego na terceirização, a questĂŁo Ă© assente no princĂ­pio da livre iniciativa do empregador.

À contratante do serviço terceirizado compete verificar a idoneidade e a capacidade econĂŽmica da terceirizada e responder subsidiariamente pelo descumprimento das normas trabalhistas, bem como obrigaçÔes previdenciĂĄrias, na forma do art. 31 da Lei 8.212/1991.

Fundamento de acordĂŁo do STF com publicação em 09/2019 dĂŁo conta que: “a terceirização nĂŁo enseja, por si sĂł, precarização do trabalho, violação da dignidade do trabalhador ou desrespeito a direitos previdenciĂĄrios. É o exercĂ­cio abusivo da sua contratação que pode produzir tais violaçÔes”.

O MunicĂ­pio como contratante originĂĄrio tem por obrigação exigir o exemplar cumprimento do contrato de saĂșde complementar para com a contratada, regido pelas normas do poder pĂșblico, instituindo sindicĂąncias e inquĂ©ritos em relação a indĂ­cios ou evidĂȘncias de irregularidades contratuais.

Embora a terceirização seja lĂ­cita, e a sequĂȘncia dos contratos devam observação ao princĂ­pio da boa fĂ© contratual, na apresentação oferecida sobre a questĂŁo hĂĄ evidĂȘncias de abusividade, pois a contratada do serviço mĂ©dico especializado detĂ©m a relação de empregador/empregado mĂ©dico, porĂ©m na versĂŁo apresentada Ă© dado forma diversa da realidade, assim sendo os mĂ©dicos contratados eram convidados a assinar contrato diverso de concurso pĂșblico ou, no mĂ­nimo, relação de emprego, e sob este aspecto os indĂ­cios de fraude e simulação para burlar a legislação trabalhista, previdenciĂĄria sĂŁo verossĂ­meis de abusividade.

É muito comum que se contratem mĂ©dicos por concurso pĂșblico e outros por meio de FundaçÔes variadas, mas a responsabilidade do MunicĂ­pio sempre existirĂĄ.

Por outro lado, as condiçÔes precĂĄrias de trabalho e a possĂ­vel infração de natureza sanitĂĄria podem sofrer intervenção do poder pĂșblico independentemente do contrato de trabalho.

É caso de encaminharem denĂșncia ao MPT, no caso do PR, serĂĄ o http://www.prt9.mpt.mp.br/servicos/denuncias. Em SC serĂĄ o http://www.prt12.mpt.mp.br/servicos/denuncias. No RJ, o http://www.prt1.mpt.mp.br/servicos/denuncias, etc.

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CrĂŽnicas do Titanic
CrĂŽnicas e prosas na perspectiva (humana, social, econĂŽmica e cultural) dos soterrados, dos desterrados, dos enterrados. Dos que ficaram para trĂĄs para salvar os que ficaram pra sair antes. Dos que saĂ­ram antes. Dos trabalhadores e trabalhadoras.